Sempre será meu ídolo no futebol – naquilo que ainda amo esse jogo e, abraçando a peleia, não consigo desligar quem me emocionou, fazendo aflorar os decibéis de paixão que o manto (sagrado) alvinegro me desperta.

Muito provavelmente a geração das redes sociais não tenha visto o Neto jogar futebol – a afinal lá se vão quase três décadas sem a magia surda do moço de Santo Antônio de Posse. Isso não alivia para os habitués de rede social, naquilo que a internet tem guardada em sua memória muitas jogadas geniais e gols em profusão que ele testilhou pelos gramados deste mundo.

Neto foi um meio campista canhoto de grandiosa habilidade, exímio passador de bola. Além disso foi um chutador emérito, a ponto de ser reverenciado enquanto um dos maiores batedores de falta da história do futebol.

Quem o revelou para o esporte bretão foi o Guarani de Campinas, mas foi no meu amado Corinthians, nos anos 90, que Neto escreveu uma das mais belas páginas de fantasia e amor de nosso futebol, naquilo que foi nosso maior meia esquerda pós Rivellino.

Antes que os incautos de plantão se manifestem e me questionem desnecessariamente, lembro que Sócrates foi ponta de lança e não meia esquerda (ou meia armador). Pode parecer um detalhe mínimo e desligado da realidade do jogo, mas (e a bem da verdade) essa distinção é tão sensível que, penso, o seu abandono/miscigenação é um dos responsáveis pela perda de protagonismo de nosso futebol nos últimos 25 anos.

Hoje, passado o seu tempo de magia, Neto é apresentador de programa esportivo (rede Bandeirante de televisão), onde teceu severa crítica à possibilidade do Guarani de Campinas (onde nasceu para o futebol) receber em seu mítico estádio (Brinco de Ouro da Princesa) o messias e seu candidato a tudo (o governador dos paulistas, Tarcísio), em um evento político.

Neto teve a grandeza de fazê-lo no ar, em pleno desenvolvimento de seu programa (‘Donos da Bola’), dando sua cara à tapa. Deveras e por óbvio, sua fala verberou na rede e recebeu de encômios a críticas. Dentre seus críticos pude ver uma fala do deputado de extrema direta Nikolas Ferreira, onde o mineiro escreveu sobre Neto: "craque de lugar nenhum, ídolo de ninguém".

O deputado mineiro é jovem e isso, provavelmente, o impede de conhecer muitas coisas que a sua busca eterna de likes, na rede, deixa em segundo plano. História, por exemplo...

Noves fora, não sei se o deputado Nikolas gosta de futebol e, em gostando, não imagino qual seja seu time de coração. Desconfio, todavia, que Nikolas torça para qualquer time de futebol que não o Corinthians, naquilo que, corintiano fosse, Nikolas jamais asseveraria "craque de lugar nenhum" para, imediatamente após, cravar "ídolo de ninguém".

Deveras, a história da democracia é, tanto quanto, a salvaguarda da capacidade crítica de um povo e, no ponto, Neto exerceu seu poder/dever de crítica, questionando enquanto ídolo máximo do Guarani o uso do estádio onde nasceu para o futebol, para um evento da extrema direita tupiniquim.

Se a extrema direita quer atacar Neto, dando corda em si mesma e jogando o jogo nojento que as fakes news estabeleceram em nosso convívio social, onde a realidade se desliga da vida e, em seu lugar, se estabelece um multiverso de interesses privados, segue o jogo – mas tenha a inteligência de não pisar no meu calo, questionando uma circunstância de interesse pessoal, naquilo que Neto tem gigantesca idolatria entre os fiéis do alvinegro de Parque São Jorge, além de ter sido um craque de bola.

Ainda que a ignorância óbvia de Nikolas não lhe permita conhecer o mundo em sua plenitude social, filosófica e histórica, a vida segue sendo (dentre outras coisas) palco de manifestação do futebol (naquilo que o esporte bretão enseja expressão artístico sociológica da existência).

Por esse viés, respondo as tolices que Nikolas deduziu, em ordem e tempo de resolver sua dúvida existencial para além do limbo que o vazio de seu questionamento encaminhou a questão – afinal, em tempos de mentira e covardia, não sou homem de deixar passar em branco uma indagação que alcança, mentirosamente, reminiscências de minha juventude...

Então, vá lá: o Neto é craque de futebol e ídolo da maior torcida da face da terra – a Fiel!

E você véio, jogou onde mesmo?

Tristes trópicos, onde a gente tem que responder o óbvio porque a história segue desafiada e negada pela extrema direita.

Saudade Pai!

João dos Santos Gomes Filho, advogado

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