Recebo mídia digital onde um cidadão (me disseram ser pastor neopentecostal) chamado Valadão defende a ideia de que os pais não deveriam encaminhar seus filhos à universidade. Ele até vocifera algumas tolices na tentativa pífia de defender sua tese (não a universidade) mas, em suma, a ideia (?) central é exatamente essa...

Nada de novo na fala do pastor, mormente se não negarmos a presença do ideário fascista no way of life tupiniquim (notadamente de 2016 em diante). O que preocupa são os possíveis ecos de seu não pensamento, naquilo que Valadão parece alcançar muitas ‘ovelhas’ acostumadas ao som de um berrante condutor.

Seria altura de balir ou, fugindo da crítica orwelliana, ir além do lugar comum onde as lamentações se encontram a caminho de desaguar no mar das ilusões, palco redivivo do sitio onde vamos ter quando a consciência se nos apresenta, seguindo em direção ao poente em um solo de guitarra (Starway to Haven?).

Não seria diferente, caro amigo, suposto que o grande capital dá sensíveis sinais de esgotamento, enquanto o modelo comercial ocidental, guerra após guerra, Palestina após Palestina, segue perdendo fôlego para a economia chinesa.

Nessa perspectiva, a fala de Valadão afaga de farialimers a rentistas não tão sofisticados, naquilo que o crescimento desenvolvimentista não é pauta de nossa elite econômica, desde que o pregão de escravos foi inaugurado por aqui – nossa primeira bolsa de valor.

Desde então seguimos apeados do trem da história e essa estação não faz florescer. Tampouco anima agônicas raízes em terra morta, naquilo que a era da mentira, estabelecida nas redes sociais, espraia sua busca pelo Santo Graal da ignorância – o apedeuta explorado na equação de mais valia de nossos dias.

Bem por isso a fala do pastor Valadão enseja metáfora sensível da exploração da força de trabalho do mais vulnerável, naquilo que quando o explorado reconhece (e a universidade é o palco desse florescimento) a própria exploração, este conhecimento desagua no desengano que nega as ilusões – para o bem e para o mal.

O ponto nevrálgico residiria na perpetuação explorativa das pessoas e do planeta, porquanto natureza e as gentes não são senão (para o grande capital) insumos e massa de manobra – Vandré (Geraldo) escreveu sobre isso em sua belíssima canção (Pra não dizer que não falei das flores, 1968) onde contrapõe (justapondo) flores à canhões, sob uma perspectiva ideológica onde a guerra encerraria as ilusões, enquanto soldados marchassem sem razão.

Fato é: poderia um pastor condenar seu rebanho ao estamento social que advém da falta de conhecimento? Haveria, nessa prumada, alguma sabedoria cristã ou, até mesmo, uma réstia de bondade religiosa? Essa fala é verdadeira? Mentirosa? Há fé nesta fala? Em quem?

Eu questiono muitas cousas. Sou irrequieto por natureza e sigo acreditando que destino é primo de delgado – ambos intestinos da servidão bruta, que usa da fé e da ignorância para seguir produzindo mão de obra barata.

Ademais, nada pior e mais nocivo que um púlpito à serviço de uma necessidade ligada à cadeia alimentar do grande capital, naquilo que o vendilhão desse templo é alguém que conduz muita gente oprimida não só pela equação social, mas ainda e também pela limitação encartada na própria fé.

O vento não conduz só palavras – ele espraia meandros por onde gaguejam os sentidos e aprisiona sonhos desenvolvimentistas de um mundo em mutação, grávido de necessidades precificadas.

Palavras são agentes transformadores da sociedade. Quando sábias (ditas por um sábio) potencializam os ouvintes, catapultando exponencialmente possibilidades de crescimento.

A mentira, outro tanto, não conduz luz – porquê nascida do anjo caído, faz da noite escura palco de sua existência, em tempo de negar ilusões, anuviando as relações ao limite da exploração valorativa dos despossuídos.

A noite anunciada na fala (mentirosa) do pastor Valadão, onde a universidade foi escanteada na ordem do dia, é escura e fria, suposto que a esperança não partilha seu convívio – antes o contrário; passa longe de púlpitos mentirosos e caídos.

Assim e então, não basta desmentir um mentiroso social quando sua maledicência advém da fé capturada de seu rebanho. É preciso ser contra a mentira e gritar a pleno pulmão: Universidade para todos. Educação para todos.

Pensei em terminar com um viva Zapata em homenagem a presidenta eleita em México (a socialista Cláudia Sheibaum). Quase o fiz. O que me impediu? Creio que o nome do pastor não cabe na mesma frase que o de Cláudia – naquilo que a mentira negacionista que ele espraiou (não a universidade), não é senão a peste embrutecida pela vida ignóbil de seu púlpito de aluguel.

Saudade Pai – você e mamãe, mais que ninguém, me empurraram rumo ao conhecimento. Obrigado!

João dos Santos Gomes Filho, advogado

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