Volta e meia múmias saem de seus sarcófagos, em sua plena decrepitude, para votar leis e prejudicar a vida dos súditos. E dizem fazer isso em nome de Deus. Imprimem na rocha, a exemplo de como fazia o velho Hamurabi, leis igualmente neolíticas que teimam em implementar nos dias de hoje. Leis cuja função é manter a população em medo constante. Essas criaturas parecem não ter qualquer estima pelo bem-estar das suas eleitoras. Odeiam que os pobres tenham acesso a educação e saúde de qualidade. E eles que ousem reclamar para ver só!

Agora a elite, essa manda e desmanda. Está acima das leis, burla as leis, compra favores e vende uma falsa imagem ao resto da população. Ou você pensa que rico vai preso? Pensa que filha de rico não aborta quando engravida antes do casamento, ou se a gravidez oferecer risco à gestante? Pense melhor! Eles se garantem a qualquer custo.

Leis desse tipo, invariavelmente, têm funções muito claras ao ir contra a dignidade das cidadãs. A partir do momento que se obriga uma criança a manter a gestação originada de um estupro, você tem dois cenários distintos: a criança rica, que realizará o aborto com toda a estrutura que o dinheiro puder comprar e seguirá sua vida normalmente; e a criança pobre, que será obrigada levar a gravidez adiante, com medo de ser condenada, e cuidar de um outro bebê por anos, sendo assim impedida de estudar e ter um bom futuro. Isso cria massas de mão de obra barata para os próximos longos anos. E isso é exatamente o que quer a elite. Em nome de Deus, obviamente.

Essa lei antiaborto se veste de ética, mas serve apenas ao interesse de quem está no topo da estrutura de poder. Não é só cortes de benefícios e verbas que impactam a vida do cidadão pobre. A própria legislação, quando estruturada em alicerces fundamentalistas, tem por finalidade botar o pobre "no seu devido lugar". Muitos futuros serão prejudicados com a aprovação da PL 1904/24. Muitas dessas meninas irão atrás de clínicas clandestinas, muitas morrerão no processo, muitas irão para a prisão, muitas perderão a infância, muitas criarão o filho de um estuprador... mas muitas.

L.R. Silva, escritor

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